A luta pelo Piso Salarial da Enfermagem

Contribuição de Rosângela Barbosa (Coletivo da Enfermagem da Bahia) e Paulo Riela (Diretório Estadual do PT Bahia e Comitê Nacional do DAP) ao Encontro Nacional do DAP

Depois de mais de 30 anos de luta da maior categoria da saúde no Brasil nasceu o PL 2.564/2020 de autoria do Senador Fabiano Contarato que foi aprovado pelo Congresso Nacional e sancionado pelo Inelegível que vetou o reajuste anual pelo INPC. A Lei 14.434/2022 estabelece o Piso salarial da Enfermagem e determina o valor de R$ 4.750 para Enfermeiras, R$ 3.325 para Técnicas de Enfermagem e R$ 2.375 para Auxiliares e Parteiras.

Essa vitória foi fruto de muitas mobilizações, manifestações de rua em todo Brasil e muitas idas a Brasília atendendo às convocações do Fórum da Enfermagem e de sindicatos. Porém, ainda quando se comemorava a vitória, todos foram surpreendidos no dia 04/09/2022 com a decisão do Ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso suspendendo a Lei. O Ministro atendeu à Ação Direta de Inconstitucionalidade movida pela entidade patronal da Confederação Nacional de Saúde (CN Saúde) e solicitou que entes públicos e privados da área da saúde esclarecessem o impacto financeiro, os riscos para empregabilidade no setor e eventual redução na qualidade dos serviços, sem que houvesse qualquer questionamento sobre a inconstitucionalidade da lei, ou seja, ela é Constitucional. O STF então, decidiu alterar a lei atrelando o piso a uma carga horária de 44 horas (inexistente no serviço publico e quase não exercida no setor privado) e determinou que o setor privado só recebesse o piso mediante convenção coletiva. Um completo atropelo!

A Lei 14.434/2022 conta ainda com 2 emendas de números 124 e 127, sendo a última referente às fontes de custeio. Foram criadas ainda durante o período de construção da lei comissões para avaliarem os impactos financeiros e abertura de diálogo entre as partes interessadas. Em 2023 foram definidas as fontes de custeio e no dia 12 de maio o presidente Lula sancionou o Projeto de Lei do Congresso Nacional destinando R$ 7,3 bilhões para o pagamento do Piso aos mais de 2,8 milhões de profissionais da Enfermagem. Porém, o STF manteve sua decisão de suspensão da Lei.

Ato em Porto Alegre-RS pelo pagamento do piso da categoria. Foto: Sindisaúde-RS

CATEGORIA NÃO ACEITA INTROMISSÃO DO STF

Para a categoria a decisão do STF é um retrocesso e vai de encontro a tudo que lutamos. Como pode o poder judiciário suspender e alterar uma lei aprovada no Congresso? O judiciário não tem a função de legislar. Não se pode aceitar essa ingerência, há de se contestar com embargos e a exigir um posicionamento dos presidentes do Senado e da Câmara onde foram aprovados por quase unanimidade o Piso. De alguma forma o Presidente Lula deve buscar reverter esta situação. Para além desse entrave imposto pelo STF, lutamos há décadas contra sobrecarga de trabalho e carga horária excessiva, e tem um PL nº 2.295/2000 que trata da redução da carga horária já aprovado no Senado e que está parado na Câmara dos deputados.

A ideia de que os 3 poderes vivessem em harmonia, cada um fazendo o seu papel, são palavras ao vento. Na verdade, a decisão do STF atende ao pedido de uma entidade patronal que lucra milhões, mas não quer pagar o Piso. Recentemente esse mesmo Supremo validou a alteração da jornada dos trabalhadores da saúde de 12h de trabalho por 36h de descanso através de acordo individual contra a própria Constituição que determina por acordo coletivo. É a justiça caolha em ação.

A “disfunção” dos poderes é, na verdade, um defeito de origem. A natureza das instituições brasileiras serve para atender aos interesses da classe dominante ao longo da história. Não foi por acaso que o STF chancelou o golpe militar em 1964 e, ainda por cima, em 2010, validou a Lei da Anistia que impedia a punição de militares inequivocamente torturadores e assassinos. Entendeu a origem desses que aí estão livres, leves e soltos tramando golpes fascistas em plena luz do dia? Todos devem lembrar a participação assídua do STF no golpe contra Dilma em 2016, na prisão de Lula em abril de 2018, justamente para não ser candidato, e da inação do Supremo contra as atrocidades de Bolsonaro, eleito à época. Já se vão 7 meses e nenhum general golpista foi preso pela conspiração fascista de 8 de janeiro, mesmo com tamanha quantidade de provas existentes.

A crise institucional hoje vista no Brasil, com os poderes da república conspirando e agindo contra o povo e a nação, é muita mais nítida do que antes. De reforma em reforma eleitoral o Congresso Nacional é atualmente o mais reacionário da história. De crise em crise o STF segue advogando a favor dos interesses das classes dominantes. Todas as conquistas obtidas foram através de luta e sangue do povo trabalhador. Porém, não houve no país uma reforma profunda no quadro institucional que permanece injusto e antipopular na essência. A república necessita ser refundada, de cabo a rabo. Quando? O quanto antes. Cada dia mais com esse arcabouço institucional, mais o país e seu povo vai para o calabouço. Caberá ao povo no seu próprio movimento e nas ruas alterar profundamente esse quadro e recolocar na ordem do dia a convocação de uma Assembleia Constituinte Soberana que nunca ocorreu no Brasil. Será o poder soberano da verdadeira representação popular capaz de refundar o estado e constituir novas instituições para garantir seus direitos e uma nação livre e soberana.

Certamente, neste processo haverá muito embate e muitas exigências urgentes aos poderes, como é a aplicação da Lei do Piso da Enfermagem. Essa luta não vai se calar. São 2.801.023 profissionais na luta em busca da tão sonhada valorização da maior mão de obra da saúde que durante a pandemia foi aplaudida e chamada de herói, mas o que é preciso mesmo é respeito aos seus direitos.

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