‘Abjeto marinheiro’: Marinha é contra João Cândido no livro de Heróis da Pátria
Por: Pedro Borges, Autor em AlmaPreta
O comandante da Marinha, Marcos Sampaio Olsen, assinou um documento enviado para a Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados com um posicionamento contrário à entrada de João Cândido, líder da Revolta da Chibata (1910), no livro de Heróis e Heroínas da Pátria. A carta foi enviada no dia 22 de abril.
A Marinha brasileira descreveu a Revolta da Chibata como uma ação “violenta” de “abjetos marinheiros”, que se “utilizaram equipamentos militares para chantagear a nação, disparando, a esmo, os canhões de grosso calibre”. O órgão militar ainda sinalizou que qualquer homenagem a João Cândido pode ser um incentivo à insubordinação por parte das tropas.
O documento é uma resposta ao parecer apresentado pelo Ministério Público Federal, que no dia 19 de abril, enviou um pedido para o Ministério da Cidadania e dos Direitos Humanos para reconhecer João Cândido como um anistiado político. O MPF também encaminhou o estudo para a Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados, para que seja apreciado o projeto de lei 4046/2021, que prevê a inscrição do líder da Revolta da Chibata no panteão dos heróis e heroínas da pátria.
Professor de História e coordenador da Uneafro-Brasil, Douglas Belchior criticou o posicionamento da Marinha Brasileira. “É uma pena para nosso país que as forças armadas brasileiras carregue historicamente esse traço reacionário, conservador, golpista e racista. A Marinha, mais uma vez, não perde a chance de explicitar essa característica. O posicionamento do comandante da Marinha reafirma o heroísmo dos revoltosos de 1910! Viva João Cândido, Herói Nacional!”.
A Revolta da Chibata
A Revolta da Chibata ocorreu em novembro de 1910, no Rio de Janeiro, então capital federal do país, como uma resposta de um grupo de marinheiros, a maioria formada por negros, contra os castigos corporais da Marinha, dentro de um contexto pós-abolição da escravatura.
Os revoltosos tomaram quatro embarcações da Marinha brasileira, Minas Gerais, São Paulo, Bahia e Deodoro, e escreveram uma carta para o presidente da época, Hermes da Fonseca, com o pedido de fim dos castigos físicos.
O governo aceitou as demandas e prometeu anistia para os participantes da revolta, o que foi descumprido dias depois do fim do motim, com a expulsão de cerca de mil pessoas por indisciplina.
A resposta foi uma segunda revolta, com a tomada do Batalhão naval, que estava estacionado na Ilha das Cobras. Este segundo movimento foi reprimido com prisões, torturas, e com marinheiros enviados para seringais na Amazônia, com alguns fuzilados durante o trajeto.