Fim da tutela militar e punição para Bolsonaro e os generais na Ação Penal 2668
Na foto: O delator tenente-coronel Mauro Cid e seu advogado no STF. Ao fundo, Bolsonaro à esquerda e o general Paulo Sérgio Nogueira à direita
O Supremo Tribunal Federal (STF) interrogou o ex-presidente Jair Bolsonaro e de outros sete réus, na maioria generais, do chamado “núcleo crucial” da intentona golpista de 8 de janeiro de 2023. A fase de instrução da AP 2628 caminha para a sua conclusão. As defesas dos réus ainda pode usar expedientes para protelar.
Uma jornalista resumiu assim esta fase: “é constrangedor, quase claustrofóbico, ver um ex-presidente no banco dos réus no STF, testando sua capacidade de enganar todo mundo ao mesmo tempo, e ouvir generais de quatro estrelas negando cadernetas manuscritas, vídeos gravados e mensagens de celular, inclusive insuflando as corporações militares contra colegas” (OESP, 13/06).
A “longa manus” dos militares na vida nacional
Desde a Proclamação da República, os generais interferem na vida política do país, promovendo golpes e intentonas que os trabalhadores e a rala democracia. Nos anos 40, 50 e 60 houve tentativas das Forças Armadas (FFAA) – os presidente eleitos Getúlio Vargas, Juscelino Kubitscheck e João Goulart foram vítimas do golpismo militar.
O golpe de abril de 1964, que derrubou João Goulart, instalou um regime de força que suprimiu os direitos políticos e os partidos, cerceou a liberdade de imprensa, sindical e impôs a censura cultural, acadêmica, cassou o mandato de deputados, governadores, juízes e militares, sobretudo de baixas patentes. A partir do famigerado Ato Institucional nº5, se promoveu uma implacável perseguição aos opositores implantando o terror de Estado — com exílio, tortura, assassinato e desaparecimento de milhares.
A partir de 1974, com a crescente resistência popular, as greves operárias de 1978 e 1979, o povo começou a perder o medo da ditadura, que iniciou um processo lento e gradual de transição por cima, com a Anistia “recíproca” (1979) que cobriu os crimes dos militares impunes, com a criação de mecanismos que garantiam os privilégios para as FFAA, tudo culminando no Colégio Eleitoral (1985), quando os milicos discretamente se puseram como tutores no fundo da cena.
Punição para Bolsonaro e os generais golpistas
A demanda das forças democráticas e populares é pela efetiva punição dos verdadeiros chefes políticos, organizadores e financiadores da tentativa de golpe em 8 de janeiro. A começar pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, o principal responsável político pelos atos golpistas — antes, durante e após o processo eleitoral de 2022.
A Comissão Parlamentar Mista de Investigação do Congresso Nacional apontou as responsabilidades na intentona golpista do ex-presidente Jair Bolsonaro e seus ex-ministros, como o general Walter Braga Neto, que foi ministro da Defesa; o general Augusto Heleno, do Gabinete de Segurança Institucional (GSI); Anderson Torres, ministro da Justiça, que elaborou a “minuta do golpe”. Na lista constam também outros altos oficiais, empresários rurais e diversos deputados da extrema direita.
Fim da tutela militar
A conduta intimidada do governo Lula garantiu a permanência do GSI sob controle dos generais, um trambolho antidemocrático e herança do SNI da ditadura; a continuidade dos nefastos CACs, que foram suspensos e voltaram sob o controle do Exército; a manutenção do ministro da Defesa José Mucio, que funciona como um estafeta da caserna no Palácio do Planalto.
A palavra de ordem “Sem Anistia” expressa o enfrentamento ao golpismo da extrema direita neste momento, é um eixo mobilizador para derrotarmos o bolsonarismo e a extrema-direita.
Mas a questão estrutural é o desmonte de todo arsenal antidemocrático erguido durante a ditadura militar, como o artigo 142 da Constituição, que cobre a tutela militar das FFAA sobre o país, via os mecanismos da GLO – Garantia da Lei e da Ordem. Ou seja, abrir as condições políticas para uma profunda reforma nas Forças Armadas – cujas academias seguem com a doutrina do “inimigo interno” – para que se dediquem a Defesa das fronteiras, como deve ser numa democracia.
Segundo o Procurador Geral da Repúblicas há muitos outros generais e altos oficiais das três armas envolvidos, eles sabiam mas, cúmplices, nada disseram. Veremos se o desfecho da AP 2628 no STF será um “acordão”, condenando Jair Bolsonaro e alguns generais para preservar, mais uma vez, o alto comando e a tutela militar.
Milton Alves, jornalista e militante do PT de Curitiba